domingo, 12 de fevereiro de 2012

Os Exterminadores do Futuro IV. 4ª Parte: das organizações infanto-juvenis totalitarias


“A nova religião fascista demanda a necessidade da crença absoluta no Fascismo, no Duce, na Revolução. Assim como alguém acredita em Deus, nós aceitamos a Revolução com orgulho, assim como aceitamos estes princípios – mesmo se acharmos que estamos sendo enganados, ainda assim os aceitamos sem discussão!” 
Augusto Turati, secretário do Partido Fascista e “apóstolo da religião da Mãe-Pátria”, dirigindo-se à Juventude Italiana.

A necessidade dos movimentos totalitários de doutrinar, mobilizar e organizar a juventude já foi abordada por mim em textos anteriores [i]. Esta necessidade parte de outra, que a antecede: a desilusão com o ser humano como ele é e a idéia delirante de que se pode construir um “Homem Novo”, segundo cânones que, por “coincidência”, correspondam exatamente ao próprio conteúdo delirante daqueles que o concebem. Esta construção é absolutamente impossível se o homem for deixado livre e, principalmente, se esta liberdade for concebida como um direito inalienável com que foi dotado pelo seu Criador, assim como a vida e a busca da felicidade.

Rousseau, ao discorrer sobre o bon sauvaje, criou um ser mitológico, uma idealização dos “homens que vivem em contato com a natureza” [ii], não como um ponto de partida de suas elucubrações filosóficas, mas antes o ponto de chegada: o “Novo Homem” que deveria ser formado através da modificação radical da sociedade humana.

Anteriormente, este mito, na verdade milenar, havia sido abordado por Montaigne que se posicionou a favor dos povos autóctones que vivem tranquilamente na natureza e contra os europeus “que só se interessam em enriquecer e corromper os povos inocentes”. Montaigne sublinhava a importância da “voz do povo”, sendo o introdutor do princípio do relativismo cultural.

A influência de Rousseau sobre os ideólogos da Revolução Francesa jamais será enfatizada suficientemente. Foi assim que Robespierre em plenoTerror declarou: “estou convencido da necessidade de promover uma completa regeneração e, se assim me posso expressar, de criar um novo povo” e forçou a aprovação de uma lei exigindo que as crianças fossem tiradas dos pais e doutrinadas em internatos estatais [iii].

Como bem o disse Alexis de Tocqueville (L’Ancien Regime et la Revolution): “os Sacerdotes da Ação dedicados à Revolução tinham uma fé fanática em sua vocação de transformar o sistema social de ponta a ponta e regenerar toda a raça humana”. Robespierre foi o primeiro a mostrar (e agir de acordo com) a necessidade do terror: “o terror nada mais é que a justiça pontual, severa, inflexível. A virtude sem o terror é impotente”. Daí a necessidade de manter um permanente estado de crise, porque esta cria um curto circuito no debate e nas deliberações democráticas.

Neste ponto especificamente reside a diferença da Revolução Francesa com a Revolução Americana: os Founding Fathers aceitaram o homem como ele é, e não como gostariam que fosse, não fizeram uma Revolução para construir um homem novo, mas para criar os alicerces sobre os quais poderia ser construído um sistema baseado na liberdade e na lei (rule of Law), como o atesta Tocqueville (Democracy in America), onde diz:

“Não se deve esquecer que é especialmente perigoso escravizar os homens nos pequenos detalhes da vida. De minha parte, eu estaria inclinado a pensar que a liberdade é menos necessária nas grandes coisas do que nas pequenas”.

Georges Sorel, pai do sindicalismo francês, ao criticar o marxismo, percebeu que as profecias de Marx sobre o mundo novo que adviria com o comunismo não passavam de um mito, um conjunto de imagens capazes de ser evocada pela massa em bloco e somente pela intuição, antes de qualquer análise refletida, e não precisariam necessariamente se cumprir: “basta que o povo acredite que se cumprirão” [iv]. A influência de Sorel foi significativa na França e principalmente na Itália, onde penetrou no fascismo e também no comunismo através de Gramsci [v].

A mitologia revolucionária antes inventa um passado mítico – o comunismo primitivo sem propriedade privada e divisão em classes, ou a glória do passado ariano germânico, ou o passado glorioso da Roma anterior ao Império – para secundariamente apresentar o futuro prometido como restauração daquele passado perfeito, conseqüentemente regenerando o homem cuja perfeição foi destruída – pela propriedade privada, ou pela mistura racial, ou pela invasão do Império pelos bárbaros. Para que estes mitos tenham resultados políticos é necessário convencer as massas insatisfeitas e explorar as emoções, nunca a razão, embora se apresentem como científicos.

Mussolini dizia que “é a fé que remove montanhas, não a razão, pois esta não pode ser a força motriz da multidão”. Hitler anunciava o fim da era da razão e o império da vontade [vi]! Quem melhor do que as crianças e os jovens para acreditar e ter fé num chamamento à sua onipotência de pensamento? “O futuro pertence a vocês!” Dando a eles uma bandeira de luta, constrói-se uma juventude fanática que se sentirá dona do futuro. Tal como o hino do Partido Fascista, La Giovinezza (A Juventude) (letra aqui) ou a canção composta por Baldur von Schirach, para a Hitlerjugend por ele comandada, a Fahnenlied (Canção da Bandeira)[vii] (tradução livre do inglês):

Nossa bandeira tremula à nossa frente,
Nossa bandeira representa nossa era,
E a bandeira nos levará à eternidade!
Sim, a bandeira significa mais para nós do que a morte.
Explorando o conflito de gerações
O cenário ideal criado pela guerra desvaneceu-se quando ela terminou, e com seu desaparecimento, o modernismo, antes dela uma visão de síntese, tornou-se uma cultura de pesadelo e negação. (...) Os anos vinte, como resultado, testemunharam um hedonismo e narcisismo de proporções extraordinárias. Modris Eksteins, na obra Rites of Spring.

Como estamos falando em partidos que surgiram simultaneamente num mesmo período de tempo, os anos pós-guerra, é preciso levar em consideração o que se convencionou chamar de “front generation” da I Guerra Mundial [viii]: os veteranos da maior e mais destrutiva guerra da história sentiam que compartilhavam o mesmo destino histórico coletivo. Foi exatamente em três países que participaram nesta guerra que matou milhões de jovens que os veteranos desiludidos e desempregados formaram as hostes dos partidos fascistas mais atuantes.

Os russos, traídos pela alta hierarquia czarista e descrentes de uma democracia que desde o início mostrou-se débil e decadente, se entregaram aos asseclas de Lênin e Trotsky, que lhes acenaram com o fim da guerra e um mundo de prosperidade. O brado “todo o poder aos soviets” foi aclamado pelo povo, acabando com o poder da Duma eleita democraticamente, e na qual os bolcheviques eram minoritários.

Os orgulhosos alemães, traídos pelas excessivas exigências das reparações de guerra dos aliados e sua aceitação plena pelos oficiais prussianos, e pelo novo governo social-democrata, a “punhalada pelas costas” exploradas pelos partidos nacionalistas, voltaram para suas casas famintos e nada encontraram para comer, nem postos de trabalho, e foram presa fácil da demagogia nacional-socialista e comunista.

A tentativa abortada de golpe comunista em 1918, comandada pela Spartakus Bund de Rosa Luxembourg e Karl Liebknecht, deu força aos nacionalistas que cedo se voltaram contra a incipiente e mal sucedida democracia de Weimar. Os italianos, embora vencedores, foram traídos pela anulação do secreto Tratado de Londres que atribuía à Itália um substancial aumento territorial, pela demagogia globalista de Woodrow Wilson e pelos interesses escusos dos outros aliados. A vittoria mutilata como a chamou Gabriele DAnnunzio, foi devidamente explorada pela retórica incendiária de fascistas e comunistas.

Os jovens, combatentes ou não, voltaram-se, nos três países, contra a geração anterior responsável pela guerra e pela humilhante derrota (no caso da vitoriosa Itália pela aceitação dos termos do Tratado de Versalhes), sendo este conflito uma parte importante, embora certamente não exclusiva, da formação dos partidos fascistas.

Karl Mannheim formulou o clássico conceito de geração: “O fenômeno social de ‘geração’ representa nada mais do que uma forma particular de identificação, englobando ‘grupos etários’ participantes do processo histórico-social” [ix], grupos de pessoas da mesma idade marcados por um comportamento geracional específico e que partilham condições históricas comuns, profundamente diferentes de contemporâneos de outros grupos etários. Deste ponto de vista, os confrontos reais dentro de uma sociedade não são entre crenças religiosas, regionalismos ou conflitos de classes, mas entre velhos e jovens. As identificações e crenças geracionais tendem a se cristalizar, senão em todos, na maioria dos que comungaram comportamentos comuns, de tal modo que as atitudes de cada um destes indivíduos geralmente não mudam durante toda a vida.

De maneira geral, entre os jovens predomina a crença de que os problemas políticos são mais bem resolvidos através de métodos violentos do que por deliberações racionais.

São, portanto, um caldo de cultura fértil para a doutrinação totalitária de partidos extremamente violentos como os comunistas, fascistas e nazistas.

Não podemos deixar de assinalar, porém, que embora este conflito inter-geracional exista, ele só terá expressão política apreciável se houver outro: o conflito intra-geracional da geração mais velha e a exploração dos jovens por parte de uma das facções deste último. Portanto, a doutrinação da juventude visa a acirrar a destrutividade natural dos jovens em proveito de imposições de facções revolucionárias dos mais velhos.

Por esta razão, não podemos supervalorizar o fator geracional. Este fator deve ser cotejado com outros, mas neste estudo preocupo-me principalmente com as organizações juvenis. A maioria das SS, incluindo os guardas dos campos de concentração SS-TV (SS-Totenkopfverbände) e das divisões armadas SS-VT (SS-Verfügungstruppe) virem da geração jovem, a maioria nascidos em torno de 1910, a maioria do grupo original das SS (Allgemeine-SS) era composta de indivíduos nascidos entre 1895 e 1900 [x]. Em 1938 a população com menos de 30 anos representava 34,6% do total da Alemanha, enquanto nas SS-TV eram 71%, nas SS-VT 57,6%, na Allgemeine-SS 19,6%; os membros do Partido Nazista perfaziam 37,6% (2.493.890) da população total [xi].

Como frisou Eksteins, o hedonismo e o narcisismo formaram a base para as mentiras revolucionárias que visavam exatamente estimulá-los com as visões apocalípticas que dotavam a juventude de um “destino manifesto” salvador da humanidade num futuro em que imperariam soberbos.

 Sequer tomavam conhecimento de que não passavam de teleguiados de interesses que não viriam a conhecer senão quando já fosse tarde demais. A imagem de Hitler em seu último aniversário saudando os garotos “combatentes” antes de descer para o Bunker para se suicidar, resume a tragédia desta juventude iludida:
Hitler e jovens
Fonte: site midia sem mascara

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