segunda-feira, 7 de maio de 2012

Bicicletas elétricas: Denatran diz que, sem lei, circulação é proibida

Carro que participava de blitz da Lei Seca tem nove multas. Estado afastou agentes por operação ter sido montada em cima de ciclovia
O carro que participou da Operação Lei Seca domingo passado, no Arpoador: nove multas
Foto: Divulgação
O carro que participou da Operação Lei Seca domingo passado, no Arpoador: nove multas
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RIO - Às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável (Rio+20), a bicicleta elétrica, um dos veículos considerados mais ecologicamente corretos da atualidade, está no centro de uma confusão que promete atormentar a cabeça de proprietários e de quem está pensando em comprar uma delas. Após a divulgação do caso do ciclista que foi multado em mais de R$ 1.700 durante uma Operação Lei Seca no Arpoador, ninguém se entende: para o estado, a bicicleta só está liberada para quem tem uma habilitação semelhante à de quem dirige motos; a prefeitura, por sua vez, diz que é possível andar à vontade, sem documento específico ou mesmo capacete, se o condutor não passar de 30km/h; por fim, a União, através do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), afirmou nesta quinta-feira em nota: “Os ciclomotores somente poderão circular quando o município tiver regulamentado a matéria”. Traduzindo: no Rio, cidade que não tem regras definidas, bicicletas elétricas não podem circular.
A posição do estado, que é quem coordena a Lei Seca através da Secretaria de Governo, foi reforçada nesta quinta-feira. Os dois agentes que multaram um cinegrafista e recolheram sua bicicleta na madrugada de domingo foram afastados. Não por abuso de poder, mas por terem montado a blitz fechando a passagem na ciclovia da Rua Francisco Otaviano com uma tenda e um carro. As infrações aplicadas ao ciclista — que registrou imagens da operação — continuam valendo: dirigir sem habilitação e sem capacete, e ter se recusado a fazer o teste do bafômetro. Até a noite desta quinta-feira, segundo o Detran, o veículo continuava num depósito, com cobranças de diárias valendo.

Mas o mesmo estado que reprime o uso das bicicletas elétricas demonstra atitudes a seu favor. Em setembro de 2009, o governador Sérgio Cabral desfilou por ruas do Maracanã, no Dia Mundial Sem Carro, montado no selim de uma delas. Sua assessoria de imprensa admitiu que ele não tinha habilitação para tal, mas alegou que ele não é usuário e que estava fazendo apenas uma demonstração. Em 2010, Cabral publicou um decreto dando isenção fiscal para empresas que montassem fábricas desses veículos no Rio.

A grande questão em torno da bicicleta elétrica é que a legislação ainda é vaga. O veículo não consta do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Uma resolução de maio de 2009 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) o equiparou a ciclomotores. E é nesse texto que o estado se baseia para exigir, por exemplo, uma habilitação semelhante à de motos. O que o Denatran diz, porém, é que seria preciso uma lei municipal para regulamentar a norma federal. E que, enquanto isso não existe, fica tudo proibido. Representante da prefeitura, o subsecretário de Meio Ambiente, Altamirando Moraes, diz, por sua vez, que ao menos por guardas municipais os ciclistas não serão punidos:

— Já há um projeto de lei em tramitação em Brasília para criar uma norma em comum para todo o país. É com uma legislação federal que o problema será resolvido. Não adianta fazermos uma regra aqui no Rio e um município vizinho, da Baixada por exemplo, ter outra. Enquanto isso, consideramos as bicicletas elétricas como comuns, desde que não sejam de alta velocidade, com limite de até 30km/h, como acontece na maior parte dos países da Europa.

Sócio de uma grande revendedora de bicicletas, Bruno Affonso acredita que haja cerca de cinco mil veículos elétricos circulando na cidade do Rio atualmente, com tendência de crescimento. Ele garante que as que vende não passam de 30km/h e espera que o entendimento da prefeitura é que fique valendo:
— Orientamos nossos clientes para que tenham uma postura responsável. Mas será um absurdo, por exemplo, se as bicicletas elétricas forem proibidas de trafegar na ciclovia.

Idealizador da ONG Transporte Ativo, voltada para a difusão do ciclismo, José Lobo diz que a legislação não acompanhou a evolução tecnológica:

— O poder público não acompanhou a velocidade dos equipamentos. Seria importante termos regras porque bicicletas elétricas potentes, que chegam a 50km/h, não devem mesmo andar por ciclovias. Isso não é permitido nem na Europa.

Independentemente da polêmica, uma questão é certa. No caso do ciclista multado no Arpoador, os agentes honraram o velho ditado “faça o que eu digo, não o que eu faço”. O veículo da Operação Lei Seca, que dava apoio à blitz e estava parado na ciclovia, tem nada menos do que nove multas, que incluem excesso de velocidade e avanço de sinal. Duas delas ainda nem foram pagas. A assessoria de imprensa da Secretaria de Governo informou que o carro não pertence ao estado e está sendo alugado desde novembro de 2011. O órgão também afirmou que o motorista responsável por duas infrações recentes, cometidas em dezembro do ano passado e em fevereiro deste ano, foi demitido. O carro está com o licenciamento em dia.

Carro que participava de blitz da Lei Seca tem nove multas

Faça o que eu digo, não faça o que eu faço. O antigo ditado está mais atual do que nunca para os agentes da Operação Lei Seca que participaram da blitz na madrugada de domingo que rebocou uma bicicleta elétrica e aplicou mais de R$ 1,7 mil em multas ao condutor. Uma consulta no site da Secretaria municipal de Transportes mostra que o Prisma placa KWT-2902, que estava parado em cima da ciclovia da Rua Francisco Otaviano, no Arpoador, dando apoio à fiscalização, tem nada menos do que nove multas. Duas delas ainda nem foram pagas. A assessoria de imprensa da Secretaria de Governo informou mais cedo que dois agentes da operação já haviam sido afastados por terem bloqueado a ciclovia.Das infrações cometidas pelo veículo da Lei Seca, quatro são de excesso de velocidade, cometidas na Avenida Brasil (três) e na Avenida Infante Dom Henrique. Há uma gravíssima: avanço de sinal na Rua J.J Seabra, cometida em setembro do ano passado, e que ainda não foi paga. Há outra por direção falando ao celular, na Rua Professor Eurico Rabelo, e mais uma por transitar em pista exclusiva, na Avenida Brasil. A lista se completa com uma infração por não identificação do condutor do veículo, sendo aplicada multa à pessoa jurídica.
A coordenação-geral da Operação Lei Seca reconheceu, nesta quinta-feira, a irregularidade em montar a blitz em cima de uma ciclovia. Na ocasião, um cinegrafista, que pediu para não ser identificado, e que guiava uma bicicleta elétrica, recebeu três multas no valor total de R$ 1.723,86 por três supostas infrações:

recusou-se a fazer o teste do bafômetro; estava sem a habilitação para dirigir um ciclomotor; e andava sem capacete. Ao todo, perdeu 21 pontos na carteira que usava para dirigir o carro que disse ter vendido para escapar das burocracias de ser dono de um automóvel.

Ainda segundo a coordenação-geral da Operação Lei Seca, este é o primeiro caso de apreensão de ciclo-elétrico realizada pelos agentes. Os coordenadores da operação, no entanto, informaram que informações sobre se a bicicleta apreendida ainda está no depósito e se condutores das tais bicicletas elétricas precisam fazer licenciamento anual, como acontece com ciclomotores não cabem à Operação Lei Seca.

A legislação ainda tem lacunas quando o assunto é bicicleta elétrica. A assessoria de imprensa da Secretaria estadual de Governo, que coordena a Lei Seca, informou que se baseia numa resolução de 2009 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). O texto equipara esse tipo de veículo a um ciclomotor: ou seja, é preciso, por exemplo, ter habilitação para dirigir moto e usar capacete para não ser multado. Também é proibido, por essa interpretação, circular por ciclovias. Já Altamirando Moraes, subsecretário municipal de Meio Ambiente, órgão gestor da política cicloviária do Rio, considera tolerável o uso de bicicletas elétricas na ciclovia:

— Também não precisa de capacete, é opcional. Fazemos como na Europa, permitindo veículos com motor de até 250 watts, que andam a até 20km/h.
 

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