Saiu na Folha.com de hoje (29/01/12):
“Rita Lee é liberada após prestar depoimento em AracajuA cantora Rita Lee, 67, foi liberada após prestar depoimento e assinar um boletim de ocorrência numa delegacia de Aracaju (SE).
Ela foi detida por policiais ao fim do último show de sua carreira, no Festival Verão Sergipe. Ao avistar policiais na plateia, a cantora declarou que não os queria em sua apresentação. ‘Vocês são legais, vão lá fumar um baseadinho’.
O imbróglio começou no meio do show, quando a cantora afirmou ter visto membros de seu fã clube, que viaja trás dela pelo Brasil, sendo agredidos pelos policiais.
Tendo se aproximado do palco, os policiais foram xingados pela cantora de ‘cavalo’, ‘cachorro’ e ‘filho da puta’. ‘Sobe aqui’, dizia Rita a eles, desafiando-os. Ela fez o show até o final, quando foi levada à delegacia.
O boletim de ocorrência foi tipificado como ‘desacato’ e ‘apologia ao crime ou ao criminoso’ (art. 287 do Código Penal). ‘A sensatez falou mais alto no momento, por isso a polícia não parou o show’, disse o tenente-coronel Adolfo Menezes, responsável pelo policiamento do show”
O que é desacato?
Chamar uma pessoa de ‘cavalo’, ‘cachorro’ ou qualquer outro termo pejorativo, com o intuito ou assumindo o risco de ofender aquela pessoa, é crime. Chama-se injúria. Mas se eu digo para o lutador de boxe que ele é ‘forte como um cavalo’ e ele, orgulhoso, me mostra os músculos flexionados, ou se eu tomo o sorvete de minha namorada e ela brinca: ‘cachorro, você sempre escolhe o maior’, não há crime. Isso porque nesses dois casos não houve o intuito de ofender (e nem se assumiu o risco de ofender), e o destinatário não se sentiu ofendido. Para que haja a injúria você precisa da combinação das duas coisas: intenção/assumir o risco mais vítima se sentir ofendida.
Mas se eu chamo um policial de ‘cavalo’ ou ‘cachorro’ por causa de sua função como agente do Estado, o crime passa a ser outro: o desacato. No desacato a ofensa não é destinada à pessoa, mas ao cargo da pessoa. No caso da matéria acima, por exemplo, se os soldados não tivessem sido reconhecidos como tais (se não estivessem uniformizados, por exemplo), eles jamais haveriam sido xingados. Logo, a ofensa é feita em relação ao seu cargo e, portanto, passa a ser desacato.
A ideia por trás do desacato é proteger não o indivíduo, mas o respeito que se deve ter às funções públicas.
Mas apenas o servidor público no exercício de sua função pode ser desacatado. A expressão ‘exercício de sua função’ é essencial aqui. Ela significa, entre outras coisas, que o servidor precisa estar agindo dentro da lei. Se ele está agindo ilegalmente e você o ofende, você não o está desacatando porque ele não está no exercício de sua função. Logo, no caso citado pela matéria, só haverá desacato se os soldados estavam no show legalmente como representantes do Estado (a tal da 'carteirada', por exemplo, não é legal), e se, além disso, estavam agindo de acordo com o que a lei e as normas de conduta de sua função determinam.
Apologia ou incitação?
A matéria acima também cita o crime de 'apologia de crime ou criminoso'.
Ao contrário do que muita gente acredita, o consumo de entorpecentes – inclusive maconha – no Brasil ainda é crime. Só não é apenado com pena de prisão, mas a pessoa ainda é punida de outras formas.
Pois bem, enaltecer, louvar ou elogiar o uso de drogas – mesmo a maconha – é fazer a apologia de crime, e isso é um crime em si, previsto no artigo 287 de nosso Código Penal, chamado de apologia de crime ou criminoso, cuja a pena chega a até 3 meses.
Mas se a pessoa diz ‘vai, usa a maconha’ ou ‘fuma um baseado’, o crime passa a ser outro, mais grave, chamado de ‘incitação ao crime’, previsto no artigo 286 do Código Penal, e cuja pena chega a 6 meses.
Reparem que há uma diferença sutil, mas importante. Enquanto fazer apologia é enaltecer ou elogiar algo, incitar é induzir ou instigar alguém a fazer alguma coisa.
Segundo a maior parte dos juristas, há mais uma diferença importante entre esses dois crimes: na apologia, o criminoso faz menção a um fato passado. É impossível eu elogiar ou enaltecer um crime que ainda não aconteceu. Já na incitação ao crime, a pessoa se refere a um fato futuro. Você não pode incitar (induzir ou instigar) alguém a fazer alguma coisa que já aconteceu. Não teria lógica.
Logo, dizer ‘vai ali no canto fumar uma maconha’ não pode ser considerado apologia, primeiro, porque isso não é um elogio ou algo parecido e, segundo, porque não se está elogiando um crime já acontecido (passado), mas incitando o cometimento de um crime que ainda precisa acontecer (futuro). Instigar alguém a cometer um crime é, portanto, incitação ao crime.
Na prática, os processos contra esses dois crimes (que são julgados pelos juizados especiais criminais, que eram antes chamados de 'pequenas causas') acabam nem sequer sendo levados adiante (é o que se chama de sursis processual, quando o processo é suspenso antes da sentença, sob a condição do beneficiado não voltar a cometer outro delito). E, mesmo se forem levados adiante, a pena acaba sendo apenas de multa ou, quando muito, a prestação de serviço à comunidade.
“Rita Lee é liberada após prestar depoimento em AracajuA cantora Rita Lee, 67, foi liberada após prestar depoimento e assinar um boletim de ocorrência numa delegacia de Aracaju (SE).
Ela foi detida por policiais ao fim do último show de sua carreira, no Festival Verão Sergipe. Ao avistar policiais na plateia, a cantora declarou que não os queria em sua apresentação. ‘Vocês são legais, vão lá fumar um baseadinho’.
O imbróglio começou no meio do show, quando a cantora afirmou ter visto membros de seu fã clube, que viaja trás dela pelo Brasil, sendo agredidos pelos policiais.
Tendo se aproximado do palco, os policiais foram xingados pela cantora de ‘cavalo’, ‘cachorro’ e ‘filho da puta’. ‘Sobe aqui’, dizia Rita a eles, desafiando-os. Ela fez o show até o final, quando foi levada à delegacia.
O boletim de ocorrência foi tipificado como ‘desacato’ e ‘apologia ao crime ou ao criminoso’ (art. 287 do Código Penal). ‘A sensatez falou mais alto no momento, por isso a polícia não parou o show’, disse o tenente-coronel Adolfo Menezes, responsável pelo policiamento do show”
O que é desacato?
Chamar uma pessoa de ‘cavalo’, ‘cachorro’ ou qualquer outro termo pejorativo, com o intuito ou assumindo o risco de ofender aquela pessoa, é crime. Chama-se injúria. Mas se eu digo para o lutador de boxe que ele é ‘forte como um cavalo’ e ele, orgulhoso, me mostra os músculos flexionados, ou se eu tomo o sorvete de minha namorada e ela brinca: ‘cachorro, você sempre escolhe o maior’, não há crime. Isso porque nesses dois casos não houve o intuito de ofender (e nem se assumiu o risco de ofender), e o destinatário não se sentiu ofendido. Para que haja a injúria você precisa da combinação das duas coisas: intenção/assumir o risco mais vítima se sentir ofendida.
Mas se eu chamo um policial de ‘cavalo’ ou ‘cachorro’ por causa de sua função como agente do Estado, o crime passa a ser outro: o desacato. No desacato a ofensa não é destinada à pessoa, mas ao cargo da pessoa. No caso da matéria acima, por exemplo, se os soldados não tivessem sido reconhecidos como tais (se não estivessem uniformizados, por exemplo), eles jamais haveriam sido xingados. Logo, a ofensa é feita em relação ao seu cargo e, portanto, passa a ser desacato.
A ideia por trás do desacato é proteger não o indivíduo, mas o respeito que se deve ter às funções públicas.
Mas apenas o servidor público no exercício de sua função pode ser desacatado. A expressão ‘exercício de sua função’ é essencial aqui. Ela significa, entre outras coisas, que o servidor precisa estar agindo dentro da lei. Se ele está agindo ilegalmente e você o ofende, você não o está desacatando porque ele não está no exercício de sua função. Logo, no caso citado pela matéria, só haverá desacato se os soldados estavam no show legalmente como representantes do Estado (a tal da 'carteirada', por exemplo, não é legal), e se, além disso, estavam agindo de acordo com o que a lei e as normas de conduta de sua função determinam.
Apologia ou incitação?
A matéria acima também cita o crime de 'apologia de crime ou criminoso'.
Ao contrário do que muita gente acredita, o consumo de entorpecentes – inclusive maconha – no Brasil ainda é crime. Só não é apenado com pena de prisão, mas a pessoa ainda é punida de outras formas.
Pois bem, enaltecer, louvar ou elogiar o uso de drogas – mesmo a maconha – é fazer a apologia de crime, e isso é um crime em si, previsto no artigo 287 de nosso Código Penal, chamado de apologia de crime ou criminoso, cuja a pena chega a até 3 meses.
Mas se a pessoa diz ‘vai, usa a maconha’ ou ‘fuma um baseado’, o crime passa a ser outro, mais grave, chamado de ‘incitação ao crime’, previsto no artigo 286 do Código Penal, e cuja pena chega a 6 meses.
Reparem que há uma diferença sutil, mas importante. Enquanto fazer apologia é enaltecer ou elogiar algo, incitar é induzir ou instigar alguém a fazer alguma coisa.
Segundo a maior parte dos juristas, há mais uma diferença importante entre esses dois crimes: na apologia, o criminoso faz menção a um fato passado. É impossível eu elogiar ou enaltecer um crime que ainda não aconteceu. Já na incitação ao crime, a pessoa se refere a um fato futuro. Você não pode incitar (induzir ou instigar) alguém a fazer alguma coisa que já aconteceu. Não teria lógica.
Logo, dizer ‘vai ali no canto fumar uma maconha’ não pode ser considerado apologia, primeiro, porque isso não é um elogio ou algo parecido e, segundo, porque não se está elogiando um crime já acontecido (passado), mas incitando o cometimento de um crime que ainda precisa acontecer (futuro). Instigar alguém a cometer um crime é, portanto, incitação ao crime.
Na prática, os processos contra esses dois crimes (que são julgados pelos juizados especiais criminais, que eram antes chamados de 'pequenas causas') acabam nem sequer sendo levados adiante (é o que se chama de sursis processual, quando o processo é suspenso antes da sentença, sob a condição do beneficiado não voltar a cometer outro delito). E, mesmo se forem levados adiante, a pena acaba sendo apenas de multa ou, quando muito, a prestação de serviço à comunidade.
Fonte: blog para entender direito (folha.com)
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